NARIZ DE APITO

Até tentou o Rivotril, mas acabou fritando. Acabou acabado. Amanheceu mais magro. Parecia até elegante. Sorriu sozinho de um jeito meio abobado. Talvez ainda estivesse bêbado. Falava umas bobagens e parecia que cada olho olhava para um lado.

- E aí, tá malzinho?
- Até que não. Tem ceva aí?
- Tem, mas só se fazer esse apito de novo? Apita aí.
Inspirou com força se rindo todo com o barulho que fez.

- Tá, pode pegar ali na geladeira.


TUDO QUEBRADO

Todos os seus discos estavam em pedaços espalhados pela sala. Todos. Quebrados. Stones, Beatles, Animals, Who, Jefferson Airplane, Free... Não existiam mais. Não passavam de lixo. Ele desconfiava (na verdade tinha certeza) que tivesse sido sua ex. Sabia que tinha que ter trocado a fechadura. Só podia ser sua ex. Haviam lhe dito que ela estava com um tipo esquisito, líder de uma espécie de religião ou seita. 

Ele devia ter acreditado. Ouviu que eles até matavam gente. Gente como ele. 

Alegavam absurdos sobre a salvação do planeta e defendiam ideologias sem fundamentos que não eram diferentes das demais religiões. Me fodi, pensou. Havia gasto grana pra caralho, e, com a sua idade, não recuperaria tudo novamente. Ligou para ela. Estava puto da vida. Um homem atendeu com a voz de mau e disse que a mulher estava no banho e desligou. Tentou mais algumas vezes, sem sucesso. 

Abriu uma cerveja e sentou-se no sofá. No silêncio. Pensando que bem provavelmente sua mulher estivesse dando para o cara com voz de mau muito antes de eles terminarem. Murchou e deixou-se escorregar na poltrona. Ligaria o som, mas estava tudo no chão. Tudo quebrado. Sua vida estava quebrada.

 Abriu outra cerveja e ligou a TV.