HISTÓRIAS QUE TOCAM O CORAÇÃO


Eu voltava para casa quando uma senhora redonda usando um óculos de intelectualóide maior que o seu rosto me abordou.
- Você gosta de ler? – perguntou.
- Gosto.
- Eu escrevo histórias que tocam o coração. Românticas, sabe?
- De uma forma ou de outra todas as histórias podem tocar.
Ela abriu um sorriso de tia e se aproveitou da minha boa vontade.
- Você é muito querido.
Devolvi outro sorriso, evitando pegar um dos seus exemplares. Ela insistiu. Peguei um. Antes de eu ler a primeira linha ela falou que cobrava apenas dois reais. Fechei o livrinho e o devolvi, agradecendo.
- Eu comprei uma cerveja agora pouco e fiquei sem dinheiro – me expliquei. E foi a verdade. E mesmo que não fosse eu iria dar a mesma desculpa. Sempre invejei as pessoas sinceras. Eu sempre precisei dar alguma desculpa.

- Qual cerveja você tomou? – perguntou.
Respondi, e a mulher lamentou por estar “trabalhando” e não poder tomar uma e resolveu me entregar um de seus escritos de presente. Ela não havia entendido que eu não queria nem de graça. Mas aceitei para me ver livre de uma vez.
- Obrigado – respondi automaticamente.

Ela colocou suas mãos em meus ombros e se despediu.

Observei sua enorme bunda se distanciando. Parecia um gigante par de bochechas que balançavam em sincronia com seu caminhar cansado da vida de inseguranças e desperdícios. Ficou parada diante de uma lata de lixo por alguns instantes e então colocou fora seus livros que tocavam o coração. Acomodou-se na mesinha em frente a um bar e pediu uma cerveja, encerrando seu expediente mais cedo e, pelo jeito, encerrando sua tentativa frustrada de se tornar uma escritora. Sábia decisão.


Aliviado por ela resolver parar de tentar tocar os corações de estranhos na rua, também coloquei meu exemplar fora.