O VELHO

Ele estava na última mesa. Havia uma mulher com ele, mas estava dormindo com a cabeça encostada na parede. Ele encarava a garrafa de vinho como se a mulher não estivesse ali. Pensativo. Parecia um velho decrépito, dos que levam suas vidas nas costas sem saber ao certo o motivo. Secou seu copo e levantou-se para ir ao banheiro. Então o reconheci. Inconfundível expressão cansada estampando uma inconformidade com o ser humano. Esperei ele voltar e me aproximei.

- Bukowski? – Perguntei

- Sim.

Ele acendeu um cigarro e deu uma tragada forte. Como se fosse um velho amigo sentei na cadeira ao lado, derramando inconveniência.

- Como vai Chinaski? – Tentei uma conversa.
Para meu espanto o velho respondeu.

- Estou pensando em acabar com ele. Vou matá-lo. Ele não merece conviver com tanta mediocridade que só pensa em enrabá-lo. – recitou.

Pedi outra garrafa, que em questão de minutos se foi. E assim com a terceira e a quarta. E incrivelmente havíamos nos esquecido da mulher que ali dormia. Ao menos eu havia esquecido. Então reparei bem. Era uma senhora com horríveis verrugas que começavam entre os seios e percorriam um caminho até o queixo. Parecia uma trilha de formigas. Toquei nelas. O velho soltou uma gargalhada rouca.

- Ela está morta. – Falou.

Toquei mais nas verrugas. Ela não se moveu. Bukowski deu uma sacudida nela.
Nada.

- Não falei?

- Falou. - Concordei, tocando na verruga que tinha mais destaque.

Levantou-se resmungando e colocando um braço do cadáver em seu ombro.
- Me ajude.

Fiz o mesmo no outro braço morto e caminhamos em direção à porta.

- Anota pra mim. – Gritou para o Mendez, o dono do bar.

Jogamos a mulher no primeiro táxi que apareceu.

- Ela está bêbada – falou Buk para o motorista. – O bar já está fechando e não havia ninguém com ela. Acho que você pode levá-la até o hospital. Coma alcoólico.

Tive que pagar a corrida antecipada. Fiquei observando o carro desaparecer no escuro.

- Ela tinha mais verrugas como aquelas? – Perguntei.

- Assustadoras.

AINDA GOSTO DESSAS PERNAS

- Cansei
- Do que?
- Cansei de olhar para a sua cara todos os dias. Nada pessoal, gosto de você. Só cansei.
- Só?
- Na verdade, acho que enjoei. Me expressei mal. Desculpe.
- Tudo bem.
- Obrigada.
- Faz tempo?
- Não lembro bem.
- Tem alguma sugestão?
- Não sei...você tem?
- Dá trabalho.
- Tem razão. Dá trabalho e não dá tempo...
- Capaz, você está ótima. Ainda gosto dessas pernas.
- Estão flácidas.
- Deixe-me ver...
- Viu só?
- É. Estão mesmo. Bem, acho melhor dormirmos.
- Também acho. Boa noite.
- Boa noite.