CHEIRO DE NOVIDADE

O ápice do prazer é quando eu recém abro ela. Sinto aquele cheiro maravilhoso. Cheirinho de novo. A textura lisinha e macia. Constantemente fico até frustrado, pois acabo dando mais valor pela sua forma, o objeto em si, do que pela leitura que irei fazer.


O mais chato é quando isso passa de uma simples mania para algo que incomoda. Quando já estou lendo a revista, mas aquele cheiro das páginas novas me desconcentra. Cheiro da tinta. Cheiro do papel. Sei lá, só sei que é bom. Isso, aliás, acontece com qualquer coisa nova saída recém da embalagem.Tem uns que gostam do cheiro de jornal. Ou gostam do cheiro de gasolina. O engraçado é que não se trata do odor de algum perfume, de alguma fragrância, e sim, apenas um cheiro sem graça.


Vai dizer que você também não gosta? Mas já se perguntou o motivo desse gosto? Bom, talvez você nem goste mesmo, eu que fico pensando que uma merda dessas seja comum, quando não é. Se quiser saber, alguns dias atrás eu estava na banca de revistas apenas olhando, mas veio uma fissura e fui obrigado a meter a cara. Não comprei. Estava com pouca grana. O cheiro ao menos é de graça.
Mas quando se está dentro do ônibus não dá pra ficar cheirando a cada 5 minutos de leitura. Tem que disfarçar. O bom é fazer como se houvesse um detalhe muito interessante e tem que olhar bem de pertinho. Ah, que alívio. Viro a página e sigo. Mais para frente costumo dar uma risada de mentira. Faço de conta que achei espetacular o texto. Dou um tapinha com as costas da mão na página. Sacudo a cabeça, incrédulo com o que acabo de (supostamente) ler. Hum, é um papel diferente, só pode. Ele entra nas narinas e gruda a folha na cara. Tenho que forçar a cabeça para trás. Às vezes, nem percebo e a revista vem junto. Dou uma tossida. Olho para a criancinha mamando nas tetas da mulher sentada ao meu lado. E assim vou indo até descer do ônibus.